Vivemos sob a égide de um estado que tem como fundamento basilar a dignidade da pessoa humana, cujo princípio alberga a proteção de valores que nutrem a própria existência do homem, tais como, saúde, integridades física e psíquica, honra, liberdade, dentre outros. Como a medicina lida com estes bens, constituídos da mais alta magnitude, é natural e consequente que qualquer ameaça ou violação contra eles, ganhe a defesa do estado e/ou do indivíduo interessado.
O Estado coloca em 1º lugar tudo aquilo que envolve a proteção do bem da vida. O médico, por sua vez, tem a incumbência de diagnosticar, prognosticar, prevenir, curar, tratar e aliviar, ou seja, o seu epicentro de trabalho é a vida humana e qualquer suspeita de irregularidade ganhará a interferência estatal. É isso que evidencia a estreita ligação entre o Direito e a medicina.
Os conflitos são inúmeros, e a cada dia têm mais destaque nos meios de comunicação. Por óbvio, como o direito é um instrumento que regula a vida em sociedade, nada mais correto que a imposição de regras aptas a ajustar este contingente de relações desordenadas. Medicina e direito são duas ciências indissociáveis.
O direito se presta a estudar e a regulamentar questões e conflitos surgidos no âmbito da saúde, com uma gama de contextualizações que vão muito além do alegado “erro médico”. Nesse caminhar, os operadores do direito do nosso país foram naturalmente sentindo a necessidade de instituírem uma especialidade que já existia com bastante força e relevo nos Estados Unidos, que é o Direito Médico e da Saúde, cuja área exige do advogado uma dedicação exclusiva, pois deve estar atento e voltado às introduções normativas que surgem diariamente, e ter ouvidos aos reclamos da sociedade no que toca ao acesso à saúde.
Podemos falar em conflitos oriundos à interpretação da lei do aborto em casos de fetos anencéfalos e dos sem viabilidade extrauterina, as pesquisas clínicas, os dilemas bioéticos no fim da vida (eutanásia, suicídio assistido, distanásia, ortotanásia, mistanásia), esterilização humana, conflitos entre usuários e planos de saúde, normas da ANVISA e da ANS, Código de Defesa do Consumidor aplicado na prática médica e hospitalar, sociedade entre médicos, a controvérsia sobre a obrigação do cirurgião plástico e do anestesiologista, omissão de socorro, sigilo profissional, esterilização humana, dentre outros assuntos palpitantes e complexos.
Nesse panorama, recrudesce a necessidade da interface entre a medicina e o direito, para que riscos e danos jurídicos sejam diminuídos e até evitados em determinados contextos.
Isso porque o trabalho jurídico desenvolvido dentro de estabelecimentos de saúde é de fulcral importância para promover o aprendizado e a conscientização da equipe multidisciplinar no que toca às regras das condutas éticas e legais que deve seguir e das implicações legais que está sujeita em caso de desobediência. Além disso, o trabalho jurídico faz ajustes nas documentações relacionadas diretamente ao paciente e à sociedade empresária, além de introduzir ferramentas destinadas a prevenir lesões à imagem e ao patrimônio da empresa.
A notícia mais feliz é que a comunicação entre o Direito e a Medicina traz inquestionáveis benefícios em prol dos estabelecimentos de saúde e dos profissionais que lá atuam, já que terão respaldo para atuar com tranquilidade e com a certeza de que o seu mister está em conformidade com os cânones que o direito impõe, o que, por desiderato, emprestará excelência no atendimento ao paciente, condição aspirada por todos os profissionais da saúde.
Giovanna Trad, sócia do Trad & Cavalcanti advogados. Advogada especialista em Direito Médico e da Saúde.