A SAÚDE É UM DIREITO DO AUTISTA E UM DEVER DAS OPERADORAS DE SAÚDE
Os planos de saúde vêm negando aos autistas o custeio de tratamento conhecido como método ABA (Análise do Comportamento Aplicada) e outras terapias necessárias ao seu desenvolvimento cognitivo, a exemplo da terapia ocupacional com especialização em integração neurossensorial e fonoaudióloga com especialidade neurossensorial. O paciente com TEA necessita desses cuidados para que sejam testadas e aprimoradas as suas habilidades adaptativas, sociais e comunicativas. Diante da recusa, os pais precisam buscar na justiça o tratamento especializado que o seu filho necessita, que envolve uma equipe multidisciplinar, como psicólogo, fonoaudiólogo, equoterapia, fisioterapia, terapia ocupacional, pediatra e outros.
2. Conheça as principais leis que asseguram o acesso à saúde das pessoas com TEA:
Lei Federal nº 12.764/2012 (institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista). Dentre outros direitos, essa Lei estabelece em seu art. 3º, III, que o autista tem direito ao diagnóstico precoce (ainda que não definitivo); ao atendimento multiprofissional; a nutrição adequada e a terapia nutricional; aos medicamentos; as informações que auxiliem no diagnóstico e no tratamento. Logo, o autista tem direito a todos os procedimentos e terapias necessárias indicadas pelo médico como a medida adequada para atender os interesses de sua saúde, sendo um dever do plano custeá-los, mesmo que se trate de tratamento com custo elevado.
Lei 13.146/2015 (Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência/Estatuto da Pessoa com Deficiência). Essa lei garante às pessoas com deficiência (e o autista integra esse conceito) o direito aos procedimentos diagnósticos e terapêuticos necessários. O art, 14 prescreve que “o processo de habilitação e reabilitação é um direito da pessoa com deficiência, que tem por objetivo o desenvolvimento de potencialidades, talentos, habilidades e aptidões físicas, cognitivas, sensoriais, psicossociais, atitudinais, profissionais e artísticas que contribuam para a conquista da autonomia da pessoa com deficiência e de sua participação social em igualdade de condições e oportunidades com as demais pessoas.” O art 15 diz que “o processo mencionado no art. 14 desta Lei baseia-se em avaliação multidisciplinar das necessidades, habilidades e potencialidades de cada pessoa”.
Inclusive, se o município ou a região contratada não tiverem disponíveis os tratamentos necessários, como a terapia ABA, os pais podem exigir que a Operadora preste o atendimento fora de domicilio, garantidos o transporte e a acomodação da pessoa com deficiência e de seu acompanhante.
Lei 9656/1998 (lei dos Planos de Saúde). O artigo 10 desta lei atesta que os planos são obrigados a oferecer cobertura de tratamento às doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde. Logo, é dever do convênio custear os tratamentos necessários ao autista (de acordo com os critérios médicos e científicos). Essa lei ainda estabelece que a pessoa com deficiência não será impedida de participar de planos privados de assistência à saúde em razão de sua condição, conforme disposto em seu art. 14.
Afora isso, temos o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Código de Defesa do Consumidor, e aquela que é a mãe de todas, a Constituição Federal, que estabelece a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) como fundamento maior da nossa República, sendo o direito à vida e à saúde (arts. 5º, XXXV e 196) indispensáveis para que o ser humano tenha uma existência digna.
3. A Justiça a favor do Autista.
Os Tribunais do Brasil inteiro e o Superior Tribunal de Justiça já determinaram ser dever do Plano arcar com o tratamento do Autismo.
Veja este julgado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul que obriga um Convênio a pagar o tratamento adequado ao paciente com TEA.
“O agravado, infante com 3 anos de idade, é portador de Transtorno do Espectro Autista (CID F 84.0) e necessita de tratamento cinco vezes na semana, por quatro horas diárias, com utilização do método ABA, terapia ocupacional com reabilitação neurossensorial e fonoterapia, com reabilitação em apraxia da fala, conforme laudo médico acostado às fls.88/89. Consoante posicionamento do STJ, o fato de eventual tratamento médico não constar do rol de procedimentos da ANS não significa, per se, que a sua prestação não possa ser exigida pelo segurado, pois, tratando-se de rol exemplificativo, a negativa de cobertura do procedimento médico cuja doença é prevista no contrato firmado implicaria a adoção de interpretação menos favorável ao consumidor. Deste modo, estão presentes elementos que evidenciam a probabilidade do direito do agravado, considerando a complexidade do quadro clínico que apresenta (criança portadora de Transtorno do Espectro Autista), bem como o fato de a patologia em questão estar devidamente listada no rol da Organização Mundial de Saúde sob o CID 10 F.84.0. Ademais, segundo assentado no parecer ministerial, o perigo de dano é evidente, pois a demora na realização do tratamento multiprofissional indicado pode acarretar danos ao desenvolvimento cognitivo da criança, de forma que a realização dos estímulos prescritos é fundamental na fase em que se encontra, consoante atestado pelo médico que acompanha a infante. (TJMS. Agravo de Instrumento n. 1405967-07.2018.8.12.0000, Chapadão do Sul, 1ª Câmara Cível, Relator (a): Des. Geraldo de Almeida Santiago, j: 28/08/2019, p: 30/08/2019)
4. As negativas injustas das Operadoras
Os tratamentos são bastante caros, por isso muitos planos não possuem em sua rede credenciada profissionais especializados que trabalham com o método.
Para não conferir cobertura aos pacientes, as operadoras justificam que o tratamento não está no rol da ANS ou que está excluído do contrato. Contudo, tais argumentos não possuem amparo legal, já que o rol da ANS não exclui direitos. Além disso, cláusulas contratuais que limitam o acesso do paciente ao tratamento de saúde são abusivas, portanto, nulas.
As operadoras ainda alegam que o número de sessões anuais atingiu o limite estabelecido pela ANS. Contudo, é vedado ao plano impor limitação ao número de sessões, especialmente porque a pessoa com o espectro necessita de tratamento massivo e contínuo, de 10 a 40 horas semanais, no mínimo. Ou seja, o estabelecido pela ANS não é suficiente para que se tenha efetividade no tratamento. É necessário muito mais.
5. O que pode ser feito para obter, de forma rápida, o tratamento na Justiça?
Em caso de resposta negativa, cabe uma ação de obrigação de fazer com pedido de tutela de urgência contra a operadora de saúde, em que uma liminar obrigará o convênio a pagar imediatamente todo o tratamento com especialistas capacitados pelo método ABA e outros indicados pelo médico.
Para a concessão da liminar, o paciente deve apresentar um relatório médico bem claro (pediatra, neurologista ou psiquiatra), com detalhamento da necessidade do tratamento, quais são as suas vantagens em comparação aos métodos menos onerosos, o número de sessões por semana e a urgência em começar o tratamento, a fim de que o paciente não tenha prejuízos irreparáveis.
O pedido liminar para tratamento do autismo é apreciado no prazo máximo de sete dias, em razão da urgência que o caso impõe, pois sabe-se que a demora para iniciar o tratamento produz sequelas importantes e irreversíveis, prejuízos irreparáveis ao desenvolvimento humano, e ainda agrava o nível do autismo, que possui três graus, quais sejam: leve, moderado e severo.
O tratamento e a estimulação no tempo certo possibilita que o paciente com TEA tenha avanços de ordem neurológica e comportamental, com uma melhor qualidade de vida e inclusão na sociedade, evitando, por exemplo, estereotipias, crises convulsivas, deficiências graves e irritabilidade excessiva.
Ressaltamos que a Justiça tem concedido a terapia ABA (e outros prescritas) em favor do autista criança/adolescente/adulto, independente do grau do espectro, pois entende-se que se trata de uma obrigação das operadoras de planos de saúde.